Muitas pessoas me perguntam como eu migrei para essa área de comportamento do consumo visto que, no Brasil, ela está engatinhando perto de outros países. E minha resposta costuma ser a mesma: porque eu sempre fui e continuo sendo uma consumidora atenta não aos produtos, mas às marcas. Acho fascinante o poder que uma experiência de compra é capaz de trazer para as pessoas. E acho mais fascinante ainda as memórias que construímos ao longo da vida sobre esses momentos.
Já faz alguns anos que falar sobre o consumidor entrou na moda. Parece que, da noite para o dia, as marcas lembraram que é ele quem faz a roda girar. Que não adianta ter um produto lindo, uma loja incrível, um atendimento excepcional se os clientes não adquirem os produtos. Uma das principais diferenças do século XX para o século XXI quando se fala sobre marketing foi o surgimento do branding e o protagonismo do consumidor. O branding trouxe com ele as questões de valor de marca, propósito, humanização das empresas e o marketing passou a trabalhar com os consumidores como peça central na definição da estratégia de cada empresa.
Quando se olha para trás e se pensa que o marketing surgiu para dar conta do consumo de massa que “nasceu” no pós-guerra de 1945, muita coisa mudou desde então. As empresas deixaram de dominar a relação de compra e venda e os consumidores que assumiram o posto de liderança. Isso ocorreu por conta de algumas questões. A primeira delas foi o aumento da oferta de produtos. Hoje, quando decidimos comprar alguma coisa (seja ela produto ou serviço) temos tantas opções que se tornou impossível conhecer todos os players. Hoje, o mercado é global e não mais regional. Quem iria imaginar que seria possível comprar – QUASE TUDO – de outro continente. A concorrência ficou tão acirrada que não basta mais “vender”, é preciso encantar.
Com isso, entramos na era do “consumo de experiência”. Chegou-se a conclusão que os consumidores não querem mais simplesmente comprar um produto, mas querem viver uma experiência de compra. E nessa esteira entram questões como marketing sensorial, como branding, como o foco no relacionamento com o cliente. Enfim, toda uma cadeia de valores que chegaram para dar suporte a um consumidor mais atento e mais exigente.
Grande parte dessa revolução ocorreu devido à popularização da internet de banda larga nos lares e nos dispositivos móveis. O acesso real time do que está acontecendo no mundo transformou a maneira como nos relacionamos com as marcas. Além disso, é impossível passar incólume a também popularização das redes sociais. Até aqui você deve estar pensando: nossa, sério? Que novidade hein?
Ironias à parte, preciso admitir que concordo com você não fosse pela minha constatação ao longo de 2017: A MAIORIA DAS MARCAS AINDA NÃO SE ADAPTARAM AO NOVO CONSUMIDOR COM UM CELULAR NAS MÃOS. E isso é impressionante!
Permita-me contar dois casos que aconteceram comigo esse ano.
O primeiro foi em junho desse ano. Eu estava em uma loja de beleza e cosméticos no bairro da Liberdade, SP. Uma loja visualmente bela. Que me chamou muita atenção naquele caos que reina na Rua Galvão Bueno. Quem conhece sabe do que eu estou falando. Eis que eu estava tão espantada com a beleza e o mix de produtos da loja que comecei a gravar um vídeo curto para compartilhar no Instagram. Recebi uma chamada em voz alta da vendedora que estava no caixa. “Senhora! Não pode filmar aqui na loja não. Eu fiquei embasbacada. Olhei para ela e disse: é sério isso? Eu estou fazendo PROPAGANDA DE GRAÇA da marca e não posso? Ok. Saí irritadíssima e não entro mais lá naturalmente.
Segundo episódio é bem parecido. Estava eu em uma loja de maquiagem no Shopping Pátio Paulista. Lançamento de uma coleção cápsula em edição comemorativa aos 20 anos da marca em questão. Embalagens belíssimas. Saco meu celular na hora para compartilhar com uma amiga que mora no Rio e que provavelmente iria querer que eu comprasse algo para ela. Vídeos são práticos para isso e facilitam mostrar os reais atributos de um produto. Bingo! O vendedor do fundo da loja grita: Senhora! Não pode filmar aqui na loja não. Eu juro que fiquei uns 10 segundos sem reação e chocada. Isso porque acima de tudo a loja tem um e-commerce com TODOS os produtos à mostra, com fotos de todos os ângulos, preço, tudo. Ou seja, pode ter a marca inteira na internet, mas o cliente que não pode fazer vídeos/fotos.
Aham. Entendi. Tá bom então, né?
E aí meus caros leitores que entra meu ponto. É sério que estamos quase em 2018 numa era totalmente mobile e o consumidor não pode interagir com a marca? É sério que as marcas criam hashtgs para concursos no Instagram, mas na hora do consumidor tirar fotos fora de promoção não pode? É sério que uma marca que tem e-commerce com todos os seus produtos absolutamente documentados por lá tem medo de cópia com um mísero vídeo feito de 10 segundos para as redes sociais?
O que eu mais vejo, escuto e leio nos eventos de marketing que eu frequento é que as marcas precisam encantar, as marcas precisam criar experiências, as marcas precisam tornar o consumidor co-criador. Mas, o que as marcas realmente fazem para que isso aconteça?
Eu tenho certeza que a essa altura do texto, alguns de vocês estão pensando: “Ah! Mas, você só está olhando o lado do consumidor”. E o VM (visal merchandising) que organizou a loja toda de maneira especial, e as técnicas de disposição das prateleiras, e as ofertas que são distintas dependendo das lojas…..enfim. Tenho certeza que existe uma linha tênue entre os direitos e deveres dos donos de loja e dos clientes. E não defendo que o cliente possa tudo, veja bem. Mas, sejamos racionais. Todas as marcas com as quais me relaciono postam tudo no Instagram. Não é possível que seja medo de “cópia” ou algo do tipo.
Hoje, o consumidor quer ser porta voz das marcas que ele consome.
Porque cada vez mais, as pessoas estão entendendo que comprar é um ato político. Que onde se escolhe por o dinheiro, é a roda que se escolhe girar. Não à toa a busca pela qualidade dos ingredientes, por quem fez o produto, pela condição da cadeia produtiva está em alta. Saber a procedência daquilo que compramos demonstra preocupação com o impacto das nossas escolhas no planeta e na sociedade.
Eu, particularmente, escolho marcas com as quais me identifico, desejo fomentar a cadeia produtiva e com as quais me dão a liberdade de poder gerar conteúdo juntamente com elas. Tou fora de empresas que não colocam os consumidores do centro de decisão das estratégias de marketing delas. E à propósito, tem vídeo das duas marcas que me proibiram de postar no meu Instagram pessoal: @camilamachion pra quem tiver a curiosidade de conferir. E a foto do artigo é de uma loja de experiência de beleza, em São Paulo, que incentiva as clientes a fazerem vídeos dentro dela.