O ano era 2002. Eu estava no Ensino Médio. E não tinha ideia do que fazer “quando crescesse.” Rs! Essa frase descreve a minha realidade, mas poderia ser aplicada a diversas pessoas que conheço. Tenho muitos amigos e conhecidos que odiaram a fase do vestibular e tem urticária só de lembrar dessa época.
A primeira coisa que me perguntavam era: “Tá! Mas, pelo menos a área você sabe? É Humanas, Exatas ou Biológicas.?” E isso eu sabia responder: era Humanas. Decidi cursar Relações Internacionais e estava feliz e satisfeita com a minha escolha. Já no segundo período tive um amigo que um dia me falou assim:
“Cara, não entendo isso das pessoas pensarem as profissões de acordo com o que elas tinham facilidade na escola. Eu era bom em Exatas, mas nunca quis ser Engenheiro, por exemplo. Eu escolhi Relações Internacionais porque eu me identifico com o tipo de trabalho e, não, porque tem História nas matérias.”
Nós não somos mais amigos e talvez ele nunca saiba o impacto que essa frase causou em mim. Eu era uma aluna considerada “nerd”, ou seja, gostava de estudar, tirava boas notas e como meus amigos não tinha a mais vaga noção de como funcionava o mercado de trabalho. Eu achava que seria uma excelente profissional simplesmente porque eu era aluna exemplar.
Isso pode parecer bobo ou muito ingêneuo. Mas, sabe por que estou escrevendo sobre isso? Porque quem tiver contato com adolescentes prestando vestibular hoje vai perceber que AINDA estamos formando estudantes dentro dessa lógica. E isso é completamente ultrapassado.
Em 2017, as escolas de Ensino Fundamental e Médio ainda estão formando seus alunos dividindo-os nesses termos: os vestibulandos de Humanas, Exatas e Biológicas. Você pode amar química e física e querer fazer Design de Moda. Ou ser fera em História e Geografia e querer fazer Engenharia. Porque ainda ficamos repetindo essas bobagens quando a realidade nos mostra que muitos profissionais atuam em áreas diferentes da formação?
O que eu mais vejo no LinkedIn e na minha rede de contatos são pessoas fazendo coaching de carreira. Coaching de vida. Coaching de propósito. Não é possível que isso não signifique alguma coisa. Nós nunca tivemos tantos profissionais insatisfeitos com suas funções, sedentos de impactarem positivamente seus entornos e sem saber para onde ir/olhar. Se antes isso era uma característica dos jovens, hoje vemos pessoas mais maduras passando por essas questões.
Meu ponto é: onde estamos errando? Como estamos decidindo nossas profissões sem nos darmos conta do que realmente gostaríamos de fazer?
Levei um bom tempo para entender que as minhas maiores qualidades como profissional não estão atreladas ao que eu gosto de ler/estudar. E sim, a como eu gosto de me sentir. A que tipo de experiência quero vivenciar com meu trabalho.
Para isso, depois de ter abandonado 6 anos de estudos intensos em Relações Internacionais, eu comecei, gradativamente, a me perguntar o que eu queria para o meu futuro trabalho. Conversei com muitos amigos, li muita coisa na internet, conversei com amigos de amigos, li livros, e tudo isso foi me trazendo pistas.
Paralelamente, passei 6 meses dando aulas de inglês para poder por a cabeça no lugar e entender o que eu precisaria fazer para ter uma relação saudável com o meu futuro trabalho. Eu sabia que não era ser professora de inglês, mas também não queria ficar parada nessa etapa de transição./descoberta.
A primeira pista veio das aulas. Eu me redescobri naquela função. Eu amava dar aulas, amava dividir meu conhecimento. E amava ter que estudar para dar aulas. Mesmo sem saber, eu já estava muito atenta ao comportamento dos meus alunos. E eu sempre buscava uma solução que eu imaginasse que seria melhor para cada um deles.
A segunda pista que constatei é que eu adorava cada dia estar em uma turma. Pessoas diferentes, idades diferentes, histórias diferentes, horários diferentes. Eu percebi que meu trabalho futuro tinha que ser assim. Cada mergulho, um flash.
A terceira e última pista veio de um amigo. Estávamos um dia conversando sobre o que fazer das nossas vidas. Ambos entediados e sem rumo. Ele disse que iria para o Canadá estudar inglês acadêmico para por a cabeça no lugar também. Rs! De lá nos falávamos e um dia ele me falou:
” Machion, descobri tua profissão. Você tem que trabalhar com pesquisa de consumo. É a sua cara. Eu tou fazendo um curso sobre isso e só penso em você. Procura alguma coisa no Brasil e vê se você curte.”
Reuni todas essas ideias e me convenci que isso poderia ser minha virada profissional. Lembrei de um livro que havia lido do Paco Underhill – Vamos às Compras e de toda a sensação de felicidade que senti lendo e me imaginando trabalhando com consumo. Mas, na época, deixei o livro guardado por achar que aquele modelo de negócio só faria sentido nos Estados Unidos, de onde é o autor.
O ano era 2011. Pesquisei com afinco e achei uma Pós Graduação Latu Sensu entitulada: Pesquisa de Comportamento e Consumo. Bingo! Era o que estava procurando. Era no que eu iria investir. Foi um ano de pós graduação e os 12 meses mais inesquecíveis da minha vida. A turma era ótima. Só pessoas inquietas e questionadoras. Só pessoas querendo aprender mais sobre aquele assunto tão fascinante. Afinal, todos nós somos consumidores.
Lá se vão 5 anos vivendo, respirando esse mercado. Foram mais de 70/80 projetos no total dos mais variados temas. De cartão de crédito platinum à papel higiênico. Das mais variadas idades. De crianças. Dos mais variados públicos. On-line e Off-line. Em diversas cidades do Brasil.
Fazer campo cansa. Mentalmente. Fisicamente. São muitas reclamações, lamúrias, tristezas. Mas, ao mesmo tempo, muitas risadas, novas ideias, profissões novas que conhecemos, pontos de vista que jamais imaginaríamos ouvir. O campo é viciante. Quem começa, nunca mais quer parar. E quem pensa que campo on-line é moleza está enganado. É tão cansativo quanto.
Mas, eu começaria tudo de novo. Quando eu poderia imaginar que ganharia dinheiro para conversar com as pessoas? Justo eu: aquela que fala até com a porta. Continuo tendo que ler muito e me atualizar de modo que meu histórico escolar me favorece nesse sentido.
E eu continuo sabendo escutar mais que falar, me emocionando com as histórias das pessoas e sabendo transformar esses sentimentos em planejamento estratégico para as marcas. O objetivo é humanizar a experiência de compra e fazer as empresas entenderem a importância do consumidor estar no centro desse processo.
O ano é 2017. E eu continuo com a mesma mania de sempre: a de entrevistar pessoas enquanto elas acham que estamos apenas conversando.